De Quissamã à Tríplice Fronteira: De bike, Filipe Maia e sua cachorra, Zayra, desbravam o Brasil, com destino à Argentina

Filipe e Zayra estão pedalando desde o dia 30 de junho de 2023, quando saíram de Barra do Furado, em Quissamã. No último dia 9 de agosto, chegaram a Foz do Iguaçu, totalizando mais de 4 mil quilômetros percorridos

Foto divulgação -Arquivo pessoal

ESPORTE PRESS BRASIL -Especial Aventura Brasil - Por Daniela Bairros

Luiz Felipe Souza Maia, ou Filipe Maia, tem 23 anos de idade. Como todo cão fiel, foi a Zayra que o adotou em Lagoa da Prata, Minas Gerais. “Eu já estava a alguns dias na cidade e então ela apareceu na Prainha, onde eu me reunia com amigos que conheci, Quando eu a vi, meu coração amoleceu. No outro dia, ela apareceu novamente e fez amizade até com um macaco prego. Os amigos colocaram pressão, escolhemos o nome dela juntos e então decidi convidar ela para a barraca onde eu estava. Ela entrou, dormiu e virou minha família”. 

Na companhia da melhor amiga e filha, Zayra, Filipe quer conhecer um pouco do Paraguai, mas o foco do próximo passo é cruzar a Argentina, passando também pelo Uruguai e chegar até o Ushuaia, a cidade mais ao sul da América Latina, na Argentina. “Um bom momento para chegar lá é no verão, com as temperaturas não tão baixas. Então, desde agosto e agora em setembro eu estou neste projeto, com expectativa de pedalar mais quatro mil quilômetros até o final do ano”. 

Foto divulgação -Arquivo pessoal

Desde o dia 9 de agosto em Foz do Iguacu, Filipe está sendo acolhido pela Associação Ciclista Cataratas do Iguaçu, enquanto resolve as documentações pendentes para sair do Brasil. 

Filipe Maia é produtor de conteúdo e artista de rua. Filho de Marcos Chagas, 44, Guarda Civil Municipal, e Flávia Cristina, 43, Servidora Pública. 

Ele conta que o sonho dos pais era que ele se formasse na faculdade. E, apesar de não amar muito, cumpria com os estudos, pois era somente o que tinha que fazer. 

Filipe cresceu e estudou nas escolas públicas de Quissamã, onde nasceu. O ensino médio foi integrado ao Curso Técnico em Informática no IFF, Campus Quissamã. 

Foto divulgação -Arquivo pessoal

 

Em 2021, quando cursava o ensino superior, foi morar em Campos dos Goytacazes para cursar Sistemas de Informação no IFF Campos Centro e trabalhar como Desenvolvedor de Software Mobile, uma vida que ele sonhava. “Foi um caminho que percorri por dois anos. Me senti realizado, mas decidi parar tudo quando um dia escutei uma notificação do PC do trabalho e que fui olhar não tinha nada. Trabalhava home office. Era uma vida que eu queria, trabalhar e estudar programação, mas me vi como um passarinho na gaiola. Eu estava na engrenagem e senti que precisava evoluir, precisava viver a vida, então a viagem que seria ao fim do curso, foi antecipada”. 
As viagens começaram em 2019, quando conheceu Jesse Koz, um viajante que já fez sua passagem, mas que mudou a forma de Filipe ver a vida. Dali em diante, viu que tudo poderia ser mais leve. Com um fusca, um cachorro e uma barraca, já era feliz. “Eu queria ter uma experiência, algo parecido, com aquela paz no olhar do Jesse, Dodongo e Shurastey. Então, em março de 2023 eu decidi trancar o curso, sair do trabalho e pegar um ônibus para alguma direção. A minha rescisão virou equipamento e minha casa virou a mochila”. 

Foto divulgação -Arquivo pessoal

Em abril daquele ano, Filipe pegou um ônibus com destino ao Espírito Santo, com a intenção de ir trabalhando como voluntário em hostel e similares. “Mochilei por 15 dias, mas senti falta do meu veículo. Desde que me entendo por gente, eu pedalo, apesar de nunca me imaginar viajar de bike, sempre rodei pelas cidades vizinhas e praias. E ali me vi na dependência de ônibus, carona, hora marcada. Não curti. Retornei para casa e mudei os planos para a bike. Amarrei a mochila na garupa, arrumei o que precisava e no dia 19 de julho de 2023 retornei para estrada, numa outra direção, a Tríplice Fronteira”. 

Filipe partiu de Quissamã e pedalou pelo litoral do Rio de Janeiro, até Paraty, onde iniciou o Caminho Velho da Estrada Real, que o levou até Ouro Preto, em Minas Gerais. De lá, começou a descer para o Sul, passando pelo estado de São Paulo e Paraná. Até que dois anos depois, chegou em Foz do Iguacu, no Paraná, depois de pedalar exatos 4.153 quilômetros. 

Para ele, viver esse universo é inexplicável. “Num dia você pode ganhar café com bolo e dormir em um hotel que um ciclista te fortaleceu. Ou dormir em uma rodoviária, sem dinheiro e ainda ser convidado a se retirar de um parque público, devido a preconceito. Mas aprendi a manter minha cabeça erguida, independente de qualquer situação. Se não está bom para mim, vou me embora, sem problema nenhum.  Seja quando eu me sentia ameaçado ou não curtia algo, meu rolê, minha vida, precisava seguir forte e em frente”.

Foto divulgação -Arquivo pessoal

 

Filipe relata também a distância e a saudade que sente da família nos pedais da vida. “De longe, um grande desafio é a distância da família. Durante esse pedal, eu retornei em casa duas vezes. Quando cheguei em Ouro Preto, em novembro de 2023, deixei a bike lá, peguei um trem de Belo Horizonte para Vitória e carona para passar o verão em casa e, quando minha irmã, Ana Beatriz, deu a luz a meu sobrinho, pude deixar a Zayra e a bike em Lagoa da Prata e dar um pulo lá de ônibus, em outubro de 2024”. 

Os dias de glória de Filipe sempre foram em meio à natureza. “Acampei em muitas cachoeiras. Dias sem voltar na cidade. Serras fantásticas, que confesso serem sofridas de pedalar, mas compensavam com vista lá de cima, como a Serra de Ouro Branco ou da Bocaína, por exemplo. Fui recebido por muitas pessoas. Passava semanas e até meses sendo muito bem acolhido e era difícil ir embora. Por eles, a gente sempre pode ficar mais um pouco, mas a despedida é algo inevitável e justamente o que torna único cada momento do encontro.”

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